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quarta-feira, 4 de março de 2020

A Origem da Expressão "Andar à Boleia" || e também "ónibus", "sopas de cavalo cansado", "bus", e outras.


 
Uma carruagem / ominus londrino do século XIX.


     Hoje usamos as expressões "apanhar boleia" ou "ir à boleia", ou outras semelhantes envolvendo o termo "boleia". O que vemos nesta gravura colorida de meio dos anos de 1800 são dois boleeiros na Baixa de Lisboa.

Dois boleeiros na Baixa de Lisboa.
     Os boleeiros eram os condutores de carruagens puxadas a cavalos (para o dizer de forma mais genérica). O banco onde se sentavam tinha o nome "boleia", daí serem boleeiros.
Os boleeiros de omnibus, por exemplo, podiam por vezes levar alguém consigo a seu lado que não tivesse dinheiro para pagar a viagem, sentado na boleia. Não ia no interior da carruagem pois não tinha dinheiro, mas não tendo dinheiro fazia à mesma a viagem. A pessoa ia assim à boleia - e mais intensidade ganha este termo se imaginarmos isto a acontecer no Inverno, com o calejamento e roupas dos boleeiros para o frio e vento no topo da carruagem, ao contrário do indivíduo que ia "à boleia".

     A título de curiosidade: os omnibus eram carruagens que funcionavam como funcionam para nós hoje os autocarros. O próprio termo omnibus é um termo de Latim que significa "para todos". O nosso BUS vem do uso inglês Bus ("autocarro"), que por sua vez vem precisamente de omnibus, das antigas carruagens. No Brasil, o ónibus - aqui com grafia de Portugal - também tem a sua origem nas antigas carruagens. Mas indo ao que interessa: ao longo de várias décadas dos anos de 1800, saíam os omnibus da Rua do Ouro (na Baixa) em direcção a Sintra, várias vezes ao dia, todos os dias.
A viagem era demorada, podendo levar quatro a cinco horas. O caminho Lisboa a Sintra não era tão directo como é hoje. Naqueles tempos existiam enormes subidas e descidas, que mais enormes se tornavam para as carruagens de então a rolarem sobre piso irregular (com o boleeiro muitas vezes quase a saltar da boleia, mesmo a essa estando preso).

     Em redor, a vegetação seca, a aridez, era em si um desconsolo. Ao longo dos montes onde hoje em dia se vêem urbanizações (Monte Abraão, Rinchoa, entre outras) viam-se, no correr dos topos das colinas, linhas de moinhos como se fossem cavaleiros gigantes com seus braços e velas armadas ao vento.

     Antes, havia-se passado por um dos sítios mais belos de Portugal, como muitos estrangeiros assim o reconheceram: a Porcalhota. Nos nossos dias é algo inimaginável, mas a quantidade de relatos torna esse facto indesmentível.

     No Cacém existia paragem obrigatória. Muitas vezes encontravam-se duos ou trios de músicos, compostos por indivíduos de roupas muito pobres, a tocarem guitarra e violino, e com uma cantora a cantar à desgarrada, improvisando versos mediante o que estava a ver em seu redor - quer ambiente, quer criaturas em seus jeitos e acções.

     Os boleeiros diziam que dali para a frente seria impensável humano ou besta conseguir continuar viagem sem parar para restabelecer energias. Aos cavalos davam uma malga de vinho tinto com pão nesse mergulhado. É deste rejuvenescer dos cavalos em longas viagens que vem o famoso termo "sopas de cavalo cansado".

     Na verdade, muitas das vezes quando saíam do Cacém não eram somente os cavalos que iam embriagados, mas também o boleeiro e os passageiros.

     Por vezes, no chegar a Sintra à noite, quando ia alguém montado a cavalo à frente da carruagem de archote na mão, o fumo espesso e as faúlhas misturavam-se com o nevoeiro que ia atingindo o rosto do boleeiro no topo da carruagem, enquanto este a fazia subir e descer as inclinações de São Pedro, para finalmente chegar então à Vila.

     Outros tempos, mas tempos de andar à boleia na mesma. E tempos em que ainda se acende um cigarro com outro, como o boleeiro o está a fazer na gravuda colorida.





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