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O Palácio da Pena por entre o Arco Triunfal de Seteais |
Analisando ou desconstruindo a Lenda de Seteais de forma mais profunda, acaba por não se chegar a nenhuma conclusão quanto ao local, e aqui a confusão bifurca-se em dois caminhos relativos à palavra “Seteais”.
Há quem diga que a mesma se deve a uma lenda, a qual daqui não consta por não ter sido encontrada – muito provavelmente encontra-se somente em tradição oral -, que diz que naquele local ao dizer-se “ai”, a interjeição ecoava por sete vezes.
O outro caminho da bifurcação da confusão quanto à origem do nome “Seteais”, é alusivo ao facto de que o referido local onde Seteais é sito, anteriormente ter sido denominado de Centeais. Este aspecto baseia-se na documentação que se encontra no Arquivo Histórico de Sintra, onde se descobre que realmente Centeais (terra de centeio) era mesmo o nome daquele lugar. Porém, aqui surge mais um conflito na lógica: para além do terreno para o cultivo de centeio ter de ser extremamente extenso em planura, o centeio (secale cereale) é uma gramínea que não se dá com o frio nem com a humidade. Mesmo tendo em conta que Sintra nem sempre foi arborizada como o é agora, recorde-se que fica junto ao litoral, e que tem um microclima muito próprio, o que leva à quase invalidação desta segundo possível origem para o nome “Seteais”.
De volta à Lenda de Seteais em si, e ao seu valor simbólico, é notório o forte pulso da religião cristã. O facto de a jovem muçulmana se apaixonar pelo Cristão Dom Mendo de Paiva – e tendo em conta o desproporcional valor que os antigos atribuiam à diferença entre o homem e a mulher – é quase como se o mais fraco acabasse por se submeter ao mais forte, do muçulmano para o cristão.
Os “ais”, sendo sinónimo de aflição por qualquer paixão sentida pela jovem moura na lenda – e tendo em conta que as paixões podem ir do ódio ao amor – fazem com que o sete no seu simbolismo de perfeição (“...e ao sétimo dia...”), consume a morte da jovem enquanto moura na sua – suposta – transição para o cristianismo, o morrer numa crença e o renascer em outra.
E essa consumação, essa morte acaba por ser gerada em ambas as lendas por um da própria crença, numa atribuição emocional de paixões sentidas, e localizadas no cristão Dom Mendes de Paiva, principalmente a raiva e o desejo de vingança, e para o povo que ouve a lenda com comoção sentimental, o obter da permissão, o ilibar do acto ou atitude, pondo-lhe um capote de bárbaro em cima, e dando ao cristão a “autorização moral” para perseguir os diferentes de crenças, exactamente quando o “ai” da perfeição (“...e ao sétimo dia...”) se dá.
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