colecções disponíveis:
1. Lendas de Sintra 2. Sintra Magia e Misticismo 3. História de Sintra 4. O Mistério da Boca do Inferno 5. Escritores e Sintra
6. Sintra nas Memórias de Charles Merveilleux, Séc. XVIII 7. Contos de Sintra 8. Maçonaria em Sintra 9. Palácio da Pena 10. Subterrâneos de Sintra 11. Sintra, Imagem em Movimento


quinta-feira, 22 de abril de 2010

Desconstrução da Lenda de Seteais - Palácio de Seteais - Parte III



© Pesquisa e texto: O Caminheiro de Sintra
Imagem: autor Flickr simbiotica ponto org


O Palácio da Pena por entre
o Arco Triunfal de Seteais

  Analisando ou desconstruindo a Lenda de Seteais de forma mais profunda, acaba por não se chegar a nenhuma conclusão quanto ao local, e aqui a confusão bifurca-se em dois caminhos relativos à palavra “Seteais”.

  Há quem diga que a mesma se deve a uma lenda, a qual daqui não consta por não ter sido encontrada – muito provavelmente encontra-se somente em tradição oral -, que diz que naquele local ao dizer-se “ai”, a interjeição ecoava por sete vezes.

  O outro caminho da bifurcação da confusão quanto à origem do nome “Seteais”, é alusivo ao facto de que o referido local onde Seteais é sito, anteriormente ter sido denominado de Centeais. Este aspecto baseia-se na documentação que se encontra no Arquivo Histórico de Sintra, onde se descobre que realmente Centeais (terra de centeio) era mesmo o nome daquele lugar. Porém, aqui surge mais um conflito na lógica: para além do terreno para o cultivo de centeio ter de ser extremamente extenso em planura, o centeio (secale cereale) é uma gramínea que não se dá com o frio nem com a humidade. Mesmo tendo em conta que Sintra nem sempre foi arborizada como o é agora, recorde-se que fica junto ao litoral, e que tem um microclima muito próprio, o que leva à quase invalidação desta segundo possível origem para o nome “Seteais”.


  De volta à Lenda de Seteais em si, e ao seu valor simbólico, é notório o forte pulso da religião cristã. O facto de a jovem muçulmana se apaixonar pelo Cristão Dom Mendo de Paiva – e tendo em conta o desproporcional valor que os antigos atribuiam à diferença entre o homem e a mulher – é quase como se o mais fraco acabasse por se submeter ao mais forte, do muçulmano para o cristão.

  Os “ais”, sendo sinónimo de aflição por qualquer paixão sentida pela jovem moura na lenda – e tendo em conta que as paixões podem ir do ódio ao amor – fazem com que o sete no seu simbolismo de perfeição (“...e ao sétimo dia...”), consume a morte da jovem enquanto moura na sua – suposta – transição para o cristianismo, o morrer numa crença e o renascer em outra.

  E essa consumação, essa morte acaba por ser gerada em ambas as lendas por um da própria crença, numa atribuição emocional de paixões sentidas, e localizadas no cristão Dom Mendes de Paiva, principalmente a raiva e o desejo de vingança, e para o povo que ouve a lenda com comoção sentimental, o obter da permissão, o ilibar do acto ou atitude, pondo-lhe um capote de bárbaro em cima, e dando ao cristão a “autorização moral” para perseguir os diferentes de crenças, exactamente quando o “ai” da perfeição (“...e ao sétimo dia...”) se dá.


© O Caminheiro de Sintra