© Pesquisa e transcrição: O Caminheiro de Sintra
Vídeo: Adriana Sousa Duarte
Imagens: ver créditos fotográficos no final deste artigo
Do excelente documentário de Adriana Sousa Duarte sobre a arquitectura do Palácio da Pena, é apresentada aqui a transcrição do mesmo, devido ao seu valor que não engloba só a arquitectura, mas o Palácio da Pena como um todo, ao que muito ajuda os depoimentos de José Martins Carneiro, ex-director do Palácio da Pena.
Parte I
"Envolto em belezas naturais, misticismo e magia, encontra-se no alto da Serra de Sintra, um dos mais emblemáticos monumentos portugueses.
Palco de memória de grandes romances e querelas familiares reais, manancial literário e simbólico, é uma das expressões máximas da arquitectura romântica em Portugal do século XIX.
Declarado Património Mundial da UNESCO em 1995, e uma das sete maravilhas de Portugal em 2007, avista-se altaneiro, o Palácio Nacional da Pena, ou o Castelo da Pena, como é vulgarmente conhecido. Quando observamos o Palácio da Pena, não podemos descontextualizá-lo do seu ambiente, aliás, isto não é possível porque o Palácio e o Parque que o envolvem traduzem uma unidade visual.
Mas nem sempre foi assim. Este esplendor natural que parece sempre ter existido, não existia. A Serra de Sintra era calva de vegetação, e o único verde que existia era o musgo das pedras no Inverno, num amontoado de penedos.
Mas quem terá sido o visionário, que transformou este lugar inóspito numa obra prima da arquitectura? Qual o limite entre a obra arquitectónica e a sua envolvência?
José Martins Carneiro: “Temos a sorte de vir para Portugal um princípe alemão/austríaco, que tem uma cultura extraordinária, invulgar para a época, e que na verdade vê crescer e desenvolver-se na Alemanha, um novo movimento artístico: o Romantismo. E, ao chegar a Portugal, e ao passar a lua de mel no Palácio da Vila, ao subir ao cimo da Serra, vê as ruínas de um antigo convento. Para um homem romântico, todo este condimento, de uma serra sem qualquer vegetação a não ser a vegatação rasteira, com pedras, rochedos enormes…por outro lado, com uma lenda a contar que Nossa Senhora da Pena tinha aparecido aqui numa lapa, numa penha, num penedo, tudo isto fascina este princípe. E na verdade, volvidos dois anos ele vai conseguir adquirir as ruínas do antigo convento, a cerca dos monges, e pensar, ele vai pensar num palácio, residência privada de Verão, mas com um jardim completamente inédito no nosso país. E portanto esta ideia de obra de arte total que agrega património verde e património edificado, é fascinante para este homem. Obviamente que ele depois tem em Portugal, um engenheiro de minas que é alemão também, que fala alemão - em Portugal deve haver pouca gente a falar alemão - e ele vai utilizar esse engenheiro de minas, para a construção aqui na Pena, de túneis…e tudo isso, toda essa experiência, digamos, de engenharia de minas deste Barão Von Eschwege, é útil ao princípe.
Narrador: As obras de construção iriam durar cerca de catorze anos, entre 1840 e 1854. Mas as remodelações e decorações só parariam com a morte do rei D. Fernando II em 1885.
Numa primeira fase como já dissemos, foi recuperado o Mosteiro. Em vista da construção do palácio novo, o projecto é ampliado até ao largo onde existia o adro da igreja, em 1841. Mas não achando ser isto o suficiente para a elevada exigência da família real, em 1842 é projectada uma nova ampliação que seria construida totalmente de raíz, com o início das obras em 1844. Podemos distingui-los claramente ao longe: o Convento está pintado de cor-de-rosa, enquanto que o Palácio está pintado de amarelo.
Vemos que a planta do Palácio Nacional da Pena é bastante irregular, composta e condicionada pela construção do Convento pré-existente ao Palácio. Também ficou obviamente restringida pela topografia, resultando num núcleo sensívelmente quadrangular organizado à volta de um claustro, e outro, alongado. Quanto às formas geométricas, o Palácio de Pena é representado por torres quadradas, circulares, semi-circulares ou facetadas de diferentes alturas, que avançam ou recuam animando as fachadas.
Quase todo o Palácio assenta em enormes rochedos. Estruturalmente podemos dividir o edifício em quatro grandes áreas: a couraça e muralhas envolventes, que serviam para consolidar a implantação da construção, com duas portas, uma das quais provida de ponte levadiça; o corpo, restaurado na íntegra do convento antigo. ligeiramente em ângulo, no topo da colina, completamente ameado com a torre do relógio; o pátio dos arcos frente à Capela, com a sua parede de arcos mouriscos; a zona palaciana fernandina com o seu baluarte cilíndrico de grande porte com o interior decorado em estilo Cathedral, segundo preceitos em voga, e motivando intervenções decorativas importantes ao nível do mobiliário e ornamentação em geral.
Durante a construção, apesar de se manter a estrutura básica, foram feitas alterações em quase todos os vãos ao mesmo que a pequena torre cilíndrica que se encostava à maior, passou para a retaguarda do edifício. O arco de entrada do corpo principal ladeado por duas torres, recebeu uma profusa decoração em relevo a imitar corais. Sobre ele, uma janela Abbott Window recebeu na sua base também em relevo, uma figura de um ser híbrido, meio peixe, meio homem, saindo de uma concha com a cabeça coberta por cabelos que se transformavam num tronco de videira cujos ramos são sustentados pela enigmática personagem. Relembra propositadamente, o homem barbado da janela da sala do coro do Convento de Cristo em Tomar, transformado aqui num ser monstruoso de carácter quase demoníaco.
Este conjunto, conhecido como Pórtico do Tritão foi programado por D. Fernando II que o desenhou como pórtico alegórico da criação do Mundo, e parece condensar em termos simbólicos a teoria dos quatro elementos.
O conjunto das diversas guaritas, o desnivelamento dos sucessivos terraços, o revestimento parietal dos azulejos, neo hispano-árabes oitocentistas, são elementos fundamentais na interpretação deste palácio. As fachadas são divididas por bocéis ou torçais, de fenestrados mais ou menos regulares, e por vãos quadrangulares, rectangulares, e de arco pleno.
As torres e os baluartes possuem anéis superiores e inferiores sobre a arcatura, formando caminhos de ronda, mirantes ou terraços.
Já as torres quadradas têm nos cunhais guaritas circulares, com coberturas cónicas. O revestimento azulejar do exterior do Palácio na fachada principal, assim como na maior parte do Palácio, terão sido criados por Wenceslau Cifka, e produzidos na Fábrica Roseira. São azulejos de padrão policromo. Vemos ainda, uma varanda ao nível do terceiro piso.
No núcleo quadrangular destacam-se várias arcadas interrompidas sobre o murete. Quase todas as torres receberam cúpulas. Os motivos de inspiração foram essencialmente colhidos em fontes mouriscas e mudéjares espanholas, e em quase todas as obras manuelinas da Estremadura, entre as quais se encontram a Torre de Belém, os Jerónimos, e o Convento de Cristo, entre outras.
Todo o monumento é uma homenagem a Portugal e à sua expansão no Mundo. O torreão, a porta férrea da entrada, o passeio da ronda, e os diversos tipos de guaritas, fazem deste palácio uma assumida evocação das memórias fortes e fundamentais, quer da cristandade, quer da história de Portugal."
© O Caminheiro de Sintra
Créditos fotográficos:
1ª fotografia: autor Flickr szeke
2ª fotografia: autor Flickr szeke
3ª fotografia: autor Flickr Willtron
4ª fotografia: autor Flickr Stan160
5ª fotografia: autor Flickr Phil Photostream
6ª fotografia: autor Flickr brumó
7ª fotografia: autor Flickr wordman1
Outros Artigos Sobre o Documentário da Arquitectura do Palácio da Pena;
José Martins Carneiro e o Palácio da Pena - Parte II
Palácio Nacional da Pena - Parte III
O Palácio da Pena e Lisboa: "Presença de Lisboa na Arquitectura do Castelo da Pena"
P.S.: Quanto à localização dos sítios mencionados neste blog, tive durante muito tempo a dúvida se a mesma haveria de ser aqui disposta ou não. Pela resolução positiva, peço que faça o melhor uso possível desta informação, o qual principalmente tem a ver com a preservação do património e a não poluição dos locais sob que forma for. Tendo boa fé em si, deixo-lhe aqui no mapa (balão "A"- para ver melhor poderá ampliar), o Palácio da Pena em Sintra, Portugal:
Ver mapa maior
Créditos fotográficos:
1ª fotografia: autor Flickr szeke
2ª fotografia: autor Flickr szeke
3ª fotografia: autor Flickr Willtron
4ª fotografia: autor Flickr Stan160
5ª fotografia: autor Flickr Phil Photostream
6ª fotografia: autor Flickr brumó
7ª fotografia: autor Flickr wordman1
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P.S.: Quanto à localização dos sítios mencionados neste blog, tive durante muito tempo a dúvida se a mesma haveria de ser aqui disposta ou não. Pela resolução positiva, peço que faça o melhor uso possível desta informação, o qual principalmente tem a ver com a preservação do património e a não poluição dos locais sob que forma for. Tendo boa fé em si, deixo-lhe aqui no mapa (balão "A"- para ver melhor poderá ampliar), o Palácio da Pena em Sintra, Portugal:
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