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segunda-feira, 3 de setembro de 2018

O Coração de Jorge Telles de Menezes




    O último artigo que escrevi para o Jornal de Sintra é para mim um dos mais especiais. Quando o escrevi quis celebrá-lo como trigésimo ao dedicá-lo ao poeta e sonhador Jorge Telles de Menezes. O Jorge já se encontrava adoentado há vários meses e quis com esta dedicatória fazê-lo sorrir, tal como a mim me continua a fazer quando da sua essência me lembro. Acabou por deixar-nos na semana em que este artigo ia ser publicado.

Uma minha memória do poeta sonhador, Jorge Telles de Menezes,
no ano de 2015 na Igreja de Santa Maria.
    A vontade de escrever esse conteúdo surgiu com uma memória em que eu, o Nuno Vicente e o Jorge saíamos de um qualquer sítio e o poeta e sonhador que nos deixou começou a evocar um episódio de William Beckford aqui em São Pedro. Desse episódio o Jorge lembrava-se do sonhador injustiçado; eu lembrava-me apenas da parte que o precedia, quando o sonhador injustiçado, Beckford, cavalgava rasgando o escuro da floresta com um véu de uma tocha, até instrumentos de sopro se terem em timbre mostrado através da espessa mata.

     Quando o escrevi lembrei-me ainda de outros poetas e sonhadores que Sintra aqui acolheu. Mas sempre com a essência e aquela memória do Jorge presente.


    « ...em inícios de Setembro, antes de chegarem à dita casa começaram na noite a ouvir, saindo da espessa mata, os sons de vozes e instrumentos de sopro. Eram os preparos que se davam para ali receberem a Rainha D. Maria I, naquela noite em que não corria aragem, naquela noite em que nem as chamas das velas junto das fontes sequer se agitavam.
    Passados dias, nesse mesmo Setembro de 1787, Beckford visitara a Penha Verde conhecendo a história do Grande Dom João de Castro. E novamente foi até à quinta onde hoje vive D. Duarte Pio de Bragança. Nessa noite em que a Rainha D. Maria I foi ali recebida, no seu chegar, sentou-se “defronte da janela de grades, detrás da qual eu estava”. Beckford, pelo seu estatuto, já deveria ter sido apresentado (...) »


    Este é um excerto da minha memória desse dia do passado em que os sonhos saíam em palavras de três bocas, mas em que o bater de cada um desses corações era, na realidade, a verdadeira e mais sincera comunicação.

As silhuetas do Jorge Telles de Menezes, do Nuno Vicente,
e a minha. Créditos Fotográficos: Lígia Cabral.
    Nem sei bem como explicar isto, mas "quando aqui cheguei" (nas infinitas aspas que a expressão pode ter) o Jorge foi a pessoa mais desprovida de complexos autóctones e de coração mais cheio que encontrei. Desde o "primeiro momento" tratou-me de uma das mais fraternas formas que neste mundo se pode sentir. O sonho comandava a sua vida, num eterno enamoramento com o bem, com o doce, com o longo núbio em que lentamente fechar os olhos se pode para viver o que nesta dimensão mais interessa e que pertença de outra é.

    O maior consolo que tenho é a certeza de que o poeta viveu como um sonhador toda a sua vida. Viveu como um sonhador, tendo alcançado o amor no fim do fio que aqui fisicamente nos une. Viveu como a vida devia ser vivida. Tão importante como a sua obra, é aquilo que o Jorge continua a ser. E foi tudo aquilo que ele foi, que ele é, aquilo que gerou a sua obra. E o que continuará a ser é o homem que para nós sempre foi. E esse homem vive nos nossos corações.

Longa existência aos Sonhadores! 💚





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